sexta-feira, 26 de março de 2010

VERSATILIDADE 1

VERSATILIDADE E SIMPATIA
ALMA  DA LÍNGUA PORTUGUESA

A Língua portuguesa desperta  razões,
sentimentos e emoções tal qual os humanos que a falam
.          

I
A PALAVRA COMO CATALIZADOR DE IDEIAS

1. Um dos conceitos básicos da linguística, como ciência da linguagem humana, é o caráter arbitrário e convencional do signo – unidade significativa. Este princípio se aplica plenamente à unidade menor do signo, o fonema - unidade distintiva.
A opinião de certos poetas ou críticos que atribuíram expressividade às vogais e consoantes, não tem suporte científico. Isto não lhe reduz o valor. As línguas têm razões  que a razão desconhece.
É sabido que os fatos que envolvem os humanos, em sua produção, principalmente na linguagem, têm 25% de dimensão científica e 75% de outras dimensões, tais como a emotiva, afetiva, evocativa, histórica, etc.
O processo humano de comunicação, de expressão e de criação de ideias é extremamente complexo.


2. Alguns atribuem cores às vogais e sensações às palavras
Assim, dizer que:
o /A/ é branco, tranqüilo;
o /E/ é amarelo, incerto
o /I/ é azul,  alegre, versátil;
o /O/ é verde, conciliador;
o /U/ é escuro, soturno.
           
Numa outra apreensão, disse A. Feliciano de Castilho: “ o A é brilhante e arrojado; o E é tênue e incerto; o I é subtil e triste; o O é forte; o U é carrancudo e turvo. Se ousássemos não temer o ridículo, compararíamos  o tom do A à harpa; o tom do E ao machete; o tom do I ao pífaro; o tom do O à trompa e o do U ao zabumba.
É uma questão subjetiva, não comprovada cientificamente. Pode ser sentida emocionalmente. Neste caso é uma questão pertinente. 
É que a cientificidade não é o único critério de validade de algo, no mundo dos humanos. Se quiséssemos atribuir uma cor dominante à Língua Portuguesa, acredito  que a cor mais  adequada seria  a azul. Mas poderia ser outra. É questão de origem subjetiva. A não ser que  fosse resultado de alguma convenção.

            3. Os fonemas e palavras, podem ser analisados na perspectiva da motivação.
Os efeitos da aliteração podem provocar determinadas sensações enfatizantes, que agem no psiquismo de quem domina tais códigos. Também age no inconsciente.
A partir da associação de um fonema a determinada ideia ou imagens (num signo arbitrário), a sua repetição num determinado ritmo, na frase, pode trazer subjacente, determinadas ideias que vão se multiplicando, como uma orquestra, trazendo sensações para além dos signos. O processo de significação do texto é algo muito complexo. Envolve muitas dimensões, linguísticas e de outros códigos.
Algumas vezes a palavra age e reage como um eficiente catalizador de ideias e sentimentos.
A língua é aberta a qualquer espécie de análise desde que seja válida científica e/ou humanisticamente e desde que seja pertinente ao texto. O efeito dos sons é uma manifestação palinguística.

4. Há canções populares cujas palavras só têm sentido pelas sensações que despertam, junto com a musicalidade.  Os signos agem e reagem a partir de diferentes códigos: linguístico, pictórico, rítmico, sonoro, etc.
Por isso se entende a enfática e profunda afirmação de UNAMUNO:

- Há, na Língua Portuguesa, para o falante do castelhano, algo juvenil. “Tem vozes que nos acariciam os ouvidos e a imaginação: saudade, soturno, luar, nevoeiro, mágoa, noivado..., vozes cuja alma é intraduzível”(pag. 22)
São as sensações sinestésicas que a linguagem produz.
Unamuno, um cientista e um homem de alma e de espírito atento à vida, detêm-se muito nestas sensações, para além do signo, ao analisar a Língua Portuguesa. Unamuno tinha  profunda admiração, respeito e veneração pelo nosso idioma.

O nosso poeta, Cruz e Sousa, através de aliterações, com a insistência no fonema /v/, produziu no leitor a sensação de vozes:
“Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias de violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos,vivas, vãs,vulcanizadas”

O Poeta português, Eugênio de Castro, (na obra – Oaristos), produziu a clara sensação  do vento fazendo ondear o trigal:


Na messe, que enlourece, estremece a quermesse... 
O sol, o celestial girassol, esmorece... 
E as cantilenas de serenos sons amenos 
Fogem fluidas, fluindo à fina flor dos fenos...

As estrelas em seus halos 
Brilham com brilhos sinistros... 
Cornamusas e crotalos, 
Cítolas, cítaras, sistros, 
Soam suaves, sonolentos, 
Sonolentos e suaves, 
Em suaves, 
Suaves, lentos lamentos 
De acentos 
Graves, 
Suaves.

            Camões escreveu poema cujas aliterações produzem a sensação da passagem de cavalos a trote.

5. A reiteração de certas terminações, rimas e aliterações, também são claramente motivados, visando ressaltar o conceito emitido, para impressionar o ouvinte.
Os provérbios populares utilizam esse recurso paralinguístico:
“Duro com duro não faz bom muro”
“Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”
“Cada macaco no seu galho”
Nestes casos a utilização dos fonemas é condicionada pela associação sinestésica que produzem

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