III
SINESTESIA–CORRESPONDÊNCIA DE SONS E CORES
10. Sinestesia- A cor e a música na Língua Portuguesa
Diz Charles Baudelair, que a poesia é a expressão da correspondência, que a linguagem é capaz de estabelecer entre o concreto e o abstrato, o material e o ideal:
“Os perfumes, as cores e os sons se correspondem”, como também os pensamentos e as emoções.
Informa-nos Rodrigues Lapa que Ramalho Ortigão considerava
saudade, uma palavra azul,
rancor, uma palavra vermelha.
Para outros, a palavra:
Brasil é amarela
Guerra é cinzenta
Clarim é amarelo
A este nível de análise dá-se o nome de sinestesias.
Filinto Elísio, poeta Português, foi quem, no século XVIII chamou a atenção para a cor das palavras.
Certamente a cor atribuída às vogais é uma atitude subjetiva que tem origem em associações de reminiscências psicológicas e se prestam a expressar o sentimento de quem lança mão de tais recursos sinestésicos.
11. Valery Larbaud, grande escritor francês, quando esteve em Portugal resolveu aprender o português.
Entusiasmado pela doçura e simpatia dos portugueses, quis, através da língua, entender-lhe a alma.
Larbaud relata de modo encantador, sua experiência, no convívio com as palavras da Língua Portuguesa.
Relatou sua experiência na sua obra “Divertimento Filológico”:
Sua primeira impressão foi a doçura e graça de certas palavras.
12. As palavras: só, sozinho, rapariga, garota, rainha, andorinha, menina, boneca, medonho, beira-mar, saudade, tinham um sabor, um colorido e um sentimento todo especial, como vemos a seguir:
Só – A palavra exprime, na sua concisão desesperada, a extrema solidão e abandono.
Sozinho – Exprime admiravelmente a atitude do espírito, dobrado sobre si mesmo, na solidão.
Rapariga – Exprime o ruído alegre e juvenil de estudantes, na escola ou na rua.
Garota – É bonita palavra para as raparigas do povo: produz um impulso terno, familiar e amoroso, sem falta de respeito.
Rainha – Sugere algo exótico, que traz no vestido o perfume da Ásia.
Menina – Um termo encantador, com ar antigo e afidalgado. Neste sentido, um alemão, LINK, que visitou Portugal nos fins do século XVIII, dizia que a expressão “minha menina” era a mais doce que se encontrava em qualquer língua.
Boneca – uma palavra que compete, em formosura, com as palavras mais belas de outras línguas.
Medonho – Palavra impressionante. Considera que há qualquer coisa de repugnante, infame e horroroso nesta palavra, que nos transmite náusea.
Beira-mar – Uma das palavras mais poéticas que conheceu: vasta, sonora, grandiosa, oceânica.
Saudade – Para Lardaud, é uma palavra formosa que sugere um céu nublado entre distantes zonas luminosas.
Outras palavras que impressionaram agradavelmente o escritor: namorar, namoro, doente, doença, vôo, dor, cor, carvalho, orvalho, cotovia, imenso, devagar, janota, ficar, poupar, meigo, brinco, brincadeira.
13. Enfim, diz Lapa, que para os escritores, palavras produzem nele, sentimentos “cheios de ressonâncias e de mistérios”.
Nesta quase antropomorfização da palavra pode ser olhado o poema de Antônio Ferreira, que antropomorfiza a própria Língua:
“Floresça, fale, cante, ouça-se e viva
A portuguesa língua, e já onde for,
Senhora vá de si, soberana e altiva.”
AUTORES CITADOS
MELO, Gladstone Chaves de. Ensaio de Estilística da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Padrão, 1976
LAPA, Manuel Rodrigues. Estilística da Língua Portuguesa. Rio: Liv. Acadêmica, 1968.
UNAMUNO,Miguel de. Por Tierras de Portugal Y de España . Madri, Espasa – Calpe, 1960.
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